REPÚBLICA, A ESPERANÇA QUE VIROU DESILUSÃO

Há precisamente 112 anos, sabedores das movimentações que estão a ocorrer em Lisboa, por todo o dia 5 de outubro de 1910 chegam à cidade de Beja, os principais líderes do Partido Republicano. Uma comunicação telegráfica particular noticia a boa nova: A República é vitoriosa. A casa de Bragança tinha caído, por fim. A novidade espalha-se e o povo da cidade aflui em massa à praça D. Manuel I. Já noite, Augusto Barreto, médico municipal em Cuba, e Francisco Pereira Coelho, advogado, falam à multidão nesta praça, que dentro de pouco tempo se chamará praça da República, e exibem o telegrama em que o ministro do Interior do Governo Provisório republicano, António José de Almeida, nomeia António Aresta Branco governador civil do distrito de Beja.

Em alegria esfusiante, o povo, dando vivas à República e cantando a "Portuguesa" e a "Marselhesa", percorre em manifestação as ruas da capital do Baixo Alentejo. O destino é a estação de caminho-ferro, praticamente fora da cidade, onde aguardam a chegada do governador civil republicano, que é recebido de forma entusiástica. Com Aresta Branco na cabeça da manifestação esta sobe o caminho que a conduz às portas de Mértola, onde o representante do Governo republicano fala aos manifestantes da janela da casa de Francisco Pereira Coelho, membro da Comissão Distrital do Partido Republicano.

No dia seguinte, 6 de outubro, a República é solene e oficialmente proclamada na Câmara Municipal, com a adesão logo ali ao novo regime do Regimento de Infantaria 17, sediado na cidade, e da vereação municipal monárquica. Poucas horas depois, no edifício da Casa Pia, é a tomada posse do novo governador civil.

Nos dias que se seguem Aresta Branco nomeia administradores para o 14 concelhos do distrito e substitui a vereação da Câmara de Beja por outra presidida por Manuel Laranja Gomes Palma, cargo que exerce até janeiro de 1914. A tomada de posse da vereação republicana ocorre a 10 de outubro e, nesse mesmo dia, muda parte da toponímia da cidade. Uns dias mais tarde, por proposta do vereador Pedro Sequeira Feio, dia 1 de maio, dia do trabalhador, passa a ser feriado municipal.

Triunfante graças ao apoio do operariado dos centros urbanos ,a República cria enormes expectativas junto do povo. No entanto, o novo regime altera muito do acessório e pouco do essencial. Substitui o real pelo escudo, o feriado do dia de Natal pelo feriado do dia da família, o bolo rei pelo bolo nacional. Muda a bandeira, o hino e os nomes das ruas, mas é incapaz de fazer as reformas necessárias na indústria, na banca e nos campos com a realização de uma reforma agrária.

É certo que o Governo Provisório aboliu os direitos da nobreza, repôs a ordem liberal, anulada pela ditadura de João Franco, avançou com a reforma do ensino e reorganizou a universidade, estabeleceu o casamento civil e instituiu o divórcio, mas não respondeu às reivindicações do movimento operário que a tinham ajudado a triunfar. Assim um surto de lutas sociais surge logo em 1910 não parando de crescer até 1913.

Perdida a base social do movimento operário e popular a República vai paulatinamente entregando-se nos braços das forças conservadoras que a liquidam, primeiro a 28 de maio de 1926, com a instauração da ditadura, e depois com o advento do salazarismo, o fascismo à portuguesa.

Constantino Piçarra


Foto de Aresta Branco

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