AS PRIMEIRAS OCUPAÇÕES DE TERRAS NO DISTRITO DE BEJA (III)

AS OCUPAÇÕES DE JUNHO DE 1975

Com a formação do IV Governo Provisório e a publicação das “bases gerais dos programas de medidas económicas de emergência”, onde é anunciada a realização da reforma agrária, o sindicato agrícola de Beja passa a travar os movimentos espontâneos de ocupação de terras que se vão constituindo. A estratégia do sindicato é esperar pelas medidas de reforma agrária prometidas pelo IV Governo Provisório, a quem chama “o nosso Governo”. Entretanto, o Estado controla a herdade dos Machados, da Casa Agrícola Santos Jorge, no concelho de Moura, nomeando uma comissão administrativa constituída pelo regente agrícola João Pedro Afonso Pires, o licenciado em finanças João Nascimento Antunes dos Santos e o técnico de contas Alexandre Maurício Marques (despacho do ministro da Agricultura, de 18/06/1975) e intervém na herdade Corte Condessa da Companhia Agrícola do Calafado, do empresário agrícola Nuno Sttau Monteiro Ferreira da Silva, situada na freguesia de Quintos, concelho de Beja, primeiro por despacho do ministro de 28/03/1975 para garantir as colheitas e, depois, por despacho de 27/05/1975, nomeando gestor público José Estêvão Botelho Fernandes. 

Enquanto o Governo vai fazendo estas intervenções, com os trabalhadores agrícolas na espectativa, o ministro da Agricultura, por despacho de 19 de maio de 1975, cria o Centro Regional de Reforma Agrária de Beja cujo diretor, o engenheiro agrónomo Manuel António Saramago de Brito e o subdiretor, o médico veterinário Marcelino Sobral tomam posse nesta cidade, a 20 de maio, na presença do ministro que, uns dias mais tarde, anuncia, no I Encontro Nacional dos Engenheiros Técnicos Agrários, a publicação para breve as leis da reforma agrária.

Tudo parece indicar que a reforma agrária vai iniciar-se sob a direção e orientação do Governo. No entanto, o mês de junho passa e as medidas anunciadas não são promulgadas. Podemos encontrar as razões deste atraso nas reservas colocadas às leis da reforma agrária no interior do IV Governo Provisório, nomeadamente por parte do PS.


O adiar da promulgação desta legislação, juntamente com a convicção enraizada nos trabalhadores temporários de que só a reforma agrária poderia resolver o problema do desemprego, conduz às primeiras ocupações de terras no distrito de Beja que se iniciam no início de junho de 1975, prolongando-se até final do ano, acontecendo mesmo em janeiro de 1976, caso da herdade que dá origem à cooperativa “Estrela do Mira”, situada na freguesia de Saboia, concelho de Odemira.

Na 1.ª fase são ocupadas no distrito de Beja as herdades da Ínsua, Misericórdia e Galinha, na freguesia de Pias, concelho de Serpa, exploradas pelo rendeiro Agro-Industrial de Moura, Lda., Diabrória, na freguesia de Beringel, concelho de Beja, Carregouçal, no concelho de Odemira e Casa Branca, freguesia de Pedrógão, concelho de Vidigueira.

Estas ocupações, especialmente as primeiras (Ínsua, Misericórdia e Galinha), vão suscitar uma reação fortíssima por parte dos grandes proprietários, o que se traduz na organização de uma concentração / protesto, a 9 de junho, junto do Centro Regional da Reforma Agrária e do Governo Civil e no envio de uma exposição, no final ao do mês, ao ministro da Agricultura onde se exige a devolução das herdades ocupadas, ao mesmo tempo que se refere que se não houver um sistema de justiça que lhes proteja os direitos serão eles a defendê-los através de um sistema de justiça privada.


O texto segue de perto Constantino Piçarra, As Ocupações de Terras no Distrito de Beja, 1974-1975, Almedina, Coimbra, 2008.

Continua

Este site usa cookies para melhorar a sua experiência. Ao continuar a navegar estará a aceitar a sua utilização.