DEBATER O ALENTEJO, UMA NECESSIDADE

            Nas vésperas da I República chegavam a Beja, provenientes de Lisboa, três comboios diários, dos quais dois seguiam para o Algarve. Com origem na província algarvia passavam também, diariamente, com paragem em Beja, dois comboios rumo à capital do país, Setúbal e linha do Norte. Com o mesmo destino somava-se ainda outro comboio, este com partida da capital do Baixo Alentejo. A carreira Beja / Moura era também diária com dois comboios, um para a ida e outro para o regresso. A este movimento ferroviário diurno juntavam-se, ainda, semanalmente, quatro comboios rápidos também com paragem em Beja. À segunda e sexta-feira o rápido Lisboa / Algarve e à quarta-feira e sábado, o mesmo comboio mas no sentido inverso.

            112 anos decorridos a situação existente é a que todos sabemos.

            Na primavera de 1927, já com a ditadura que derrubou a I República implantada, desponta em Beja um enorme movimento cívico, encabeçado pelo Partido Republicano da Esquerda Democrática, liderado por Soveral Rodrigues, reivindicando a construção de uma linha de caminho-de-ferro que ligasse Beja a Sines. O semanário "Ala Esquerda", na sua edição de 7 de Abril de 1927, escrevia: "Não percamos a esperança, nós os bejenses, de ainda podermos um dia ir de manhãzinha, ali abaixo, a Sines, buscar o peixe para o nosso almoço, colhendo na passagem um ramo de frescas rosas nos formosos jardins da ridente Miróbriga".

            95 anos passados percebe-se que a modernização do país, decorrente da nossa adesão à União Europeia, ao privilegiar, em matéria de vias de comunicação, as autoestradas em detrimento do caminho-de-ferro não nos fez avançar na senda do desenvolvimento.

            Em março de 1929, o debate em Beja é dominado pelo Congresso sobre o Alentejo que se iria realizar, em Évora, no início do verão deste ano. A esquerda do republicanismo, achava que o Congresso não se podia limitar a uns quantos discursos, mas antes servir para delinear um programa de fomento económico, social e cultural da província. Para o alcançar deste objetivo defendiam um Congresso construído da base para o topo. com comissões distritais e elaboração de teses a este nível regional amplamente discutidas.

            93 anos volvidos, a discussão sobre o futuro do Alentejo ou mesmo do Baixo Alentejo é algo confrangedora. Discute-se, e bem, a necessidade de uma ligação ferroviária Beja/Lisboa e Beja /Algarve, mas não se discute a necessidade de acabar com a monocultura do olival e do amendoal intensivo, implementando em sua substituição uma agricultura ecologicamente sustentável, de base familiar, competitiva, edificada com base na água do Alqueva e numa reestruturação fundiária que pusesse fim ao latifúndio, única forma de valorização das nossas vilas e aldeias e com isto incrementar outros setores de atividade económica. Discute-se, e bem, a importância do desenvolvimento turístico da região, mas não se integra neste debate a necessidade de um plano de preservação patrimonial nos seus múltiplos aspetos (arquitetónico, natural, etnográfico, histórico, etc.). Discute-se o ensino, e bem, mas não se define um plano para a educação, a ciência e a cultura que fosse um instrumento decisivo no desenvolvimento da região, onde a criação de uma Universidade do Alentejo aberta à bacia do mediterrâneo e à comunidade lusófona fosse um dos eixos centrais desse plano.   

            Sem um Parlamento regional eleito pelo voto popular, de onde saia um governo com amplas competências de atuação, servido da dotação orçamental necessária, dificilmente a discussão que importa fazer sobre o Alentejo será uma realidade.   

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