AS PRIMEIRAS OCUPAÇÕES DE TERRAS NO DISTRITO DE BEJA (I)

A AGUDIZAÇÃO DOS CONFLITOS NOS CAMPOS

A assinatura do contrato coletivo de trabalho rural para o distrito de Beja, em 29 de outubro de 1974, para vigorar até 30 de setembro de 1975, marca o início da segunda fase da luta dos assalariados rurais pela garantia de emprego. Deste contrato, em matéria de emprego, ressalta a aceitação, por parte dos agricultores, em ficarem sujeitos à colocação de assalariados rurais nos casos em que as suas explorações agrícolas sejam consideradas em estado de subaproveitamento.

Para avaliar a situação nas herdades e proceder à respetiva distribuição de trabalhadores, se fosse esse o caso, são criadas duas comissões. Uma a nível concelhio, composta por um técnico agrícola nomeado pelo Governo, dois representantes dos agricultores e dois delegados dos trabalhadores. Outra de âmbito distrital, constituída por cinco técnicos representando um a Secretaria de Estado do Trabalho, três a Secretaria de Estado da Agricultura e um a Secretaria de Estado do Emprego, cuja função é apreciar e decidir sobre as contestações apresentadas pelos agricultores alvos de distribuição de pessoal.

Como o funcionamento das comissões concelhias se mostra moroso, a impaciência dos assalariados rurais aumenta à medida que o tempo passa e o desemprego persiste. Exemplo desta impaciência é a moção aprovada, na segunda quinzena de 1974, num plenário de assalariados rurais, em Albernoa, com o intuito de ser enviada ao Governo, onde se denuncia o facto de haver setenta trabalhadores agrícolas desempregados na freguesia sem que se vislumbre resolução para o problema. Acusam a comissão concelhia de morosidade na fiscalização das explorações agrícolas e dão um prazo de dez dias às instâncias governamentais para resolver a situação sob pena de serem eles, os próprios trabalhadores, a resolvê-la.

É esta pressão dos trabalhadores agrícolas desempregados no sentido de verem a sua situação resolvida que acelera o processo de fiscalização do aproveitamento das herdades e de colocação dos assalariados rurais. Seguindo o princípio da prioridade aos homens e às mulheres cabeça de casal os primeiros alvos das colocações de pessoal vão ser os grandes proprietários agrícolas. Em Moura, nas terras da Têxtil Manuel Gonçalves são colocados quarenta e cinco homens por noventa dias, na herdade dos Machados, da Casa Agrícola Santos Jorge, trinta e cinco homens como efetivos e na herdade Donas Maria, explorada pelo empresário Francisco Gonçalves da Cruz, quarenta e cinco eventuais. No concelho de Beja, na herdade da Apariça, da Companhia Agrícola da Apariça, são colocados noventa homens como efetivos. Na Vidigueira, em diversas propriedades de Francisco Manuel Fragoso Barahona são colocados setenta e cinco trabalhadores como efetivos e cinquenta como eventuais.

A este processo de distribuição de trabalhadores pelas diversas herdades do distrito vão responder os grandes proprietários, numa primeira fase, com a contestação das decisões das comissões concelhias de distribuição de pessoal. Em quinze das dezasseis reuniões realizadas pela comissão distrital de colocação de trabalhadores, no período compreendido entre 21 de novembro de 1974 e 23 de janeiro de 1975, são analisadas duzentas e vinte e sete contestações apresentadas pelos agricultores do distrito, o que é bem revelador da dimensão da oposição destes à distribuição de assalariados rurais de que estavam a ser alvo.

É neste quadro que os agricultores, alvo da distribuição de trabalhadores, se vão subtraindo como podem a este encargo. Não apanham a azeitona, tarefa que implica a utilização de muita mão-de-obra e, em vez de requisitarem pessoal junto das comissões sindicais, optam pelo lançamento de empreitadas. Perante estes comportamentos, o sindicato agrícola vem a público exigir medidas muito duras por parte do Governo contra estes agricultores.

O Governo reage, com o secretário de Estado do Trabalho, Carlos Carvalhas, afirmando, em Beja, dia 2 de dezembro de 1974, que os agricultores tinham que acatar as decisões das comissões de colocação de trabalhadores. No entanto, o conflito nos campos vai-se agudizando entre agricultores e assalariados rurais desempregados.

(Continua)

O texto segue de perto Constantino Piçarra, As Ocupações de Terras no Distrito de Beja, 1974-1975, Almedina, Coimbra, 2008.

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