AS PRIMEIRAS OCUPAÇÕES DE TERRAS NO DISTRITO DE BEJA (Conclusão)

AS OCUPAÇÕES DE OUTUBRO, NOVEMBRO E DEZEMBRO DE 1975

A 6 de setembro de 1975 cai o V Governo Provisório. A formação do VI Governo, que toma posse a 19 deste mês, é a expressão no plano da governação da alteração da correlação de forças no seio do MFA, que vem fazendo o seu caminho desde as eleições para a Assembleia Constituinte em 25 de Abril de 1975, com o triunfo do “Grupo dos nove” sobre as fações militares revolucionários organizados em torno do Primeiro-ministro do V Governo Provisório, general Vasco Gonçalves, e do COPCON de Otelo Saraiva de Carvalho, as quais constituem o campo da revolução socialista.

Por isto mesmo, no período que medeia entre a queda de um Governo e a tomada de posse de outro, os sindicatos agrícolas, com especial realce para o de Beja, avançam com um conjunto de iniciativas de massas destinadas a evitar que o retrocesso da reforma agrária se transformasse num objetivo político do VI Governo.

Assim, na cidade de Beja, o Sindicato dos Trabalhadores Agrícolas convoca para 17 de setembro uma paralisação agrícola com concentração dos trabalhadores na capital de distrito onde estão cerca de 100 mil pessoas e é aprovada uma moção onde se exige a formação de um Governo que garanta o avanço do processo revolucionário, a participação das ligas e sindicatos agrícolas na elaboração das leis que dissessem respeito à reforma agrária e o apoio financeiro às explorações agrícolas de pequenos e  médios agricultores e às unidades coletivas de produção.

A paralisação do trabalho agrícola ainda se mantém até dia 19 de setembro, sendo neste dia desconvocada em resultado do encontro ocorrido na véspera entre representantes da Liga de Pequenos e Médios Agricultores e do Sindicato dos Trabalhadores Agrícolas do Distrito de Beja e o almirante Pinheiro de Azevedo, indigitado como Primeiro ministro do VI Governo Provisório.

A garantia de Pinheiro de Azevedo de que a reforma agrária iria continuar é secundada pelo novo ministro da Agricultura, António Lopes Cardoso, que em sessão de esclarecimento realizada em Beja, a 20 de setembro, refere que “os latifundiários que julgam que o VI Governo Provisório não vai prosseguir a reforma agrária, enganam-se”.

Ultrapassadas as dúvidas dos assalariados rurais em relação ao futuro da reforma agrária, fica por resolver, segundo estes, a necessidade urgente do crédito agrícola de emergência, criado pela equipa ministerial liderada por Fernando Oliveira Baptista, ser extensível ao pagamento de salários dos trabalhadores de UCP (s) – Unidades Coletivas de Produção – e cooperativas. Esta reivindicação é satisfeita pela ação de António Bica, do PCP, secretário de Estado de Estruturação Agrária, quando por despacho de 29 de setembro de 1975 determina o alargamento da concessão do crédito agrícola de emergência às novas unidades de produção geridas coletivamente pelos trabalhadores para pagamento de salários.

Esta medida que ultrapassa, em muito, as dificuldades sentidas na gestão de UCP(s) e cooperativas, juntamente com a necessidade de fazer as sementeiras de outono nas terras alvo de expropriação nos termos da lei, mas ainda detidas pelos seus proprietários, e o previsível resvalar da situação política para a direita, com a inerente alteração da correlação de forças desfavorecendo os trabalhadores, estão na origem da terceira fase de ocupações que no distrito de Beja significam a tomada pelos assalariados rurais de 233 420 hectares de terra, 73,35% do total, sendo que só no mês de outubro passaram para controle dos trabalhadores, neste distrito, 177 801 hectares.  

É, ainda, nesta terceira fase de ocupações que, por iniciativa do sindicato agrícola, se dá a unificação das herdades ocupadas em grandes unidades de produção em torno de uma freguesia que, no início de 1976, no Baixo Alentejo, são 110.

O texto segue de perto Constantino Piçarra, As Ocupações de Terras no Distrito de Beja, 1974-1975, Almedina, Coimbra, 2008.

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