A MOBILIZAÇÃO POPULAR NAS NEVES, NO BAIRRO DO PELAME E EM ALBERNOA

Paralelamente à luta dos trabalhadores agrícolas do concelho e do distrito de Beja em torno da assinatura do contrato coletivo de trabalho, outras movimentações populares se vão desenvolvendo e radicalizando. A derrota da tentativa de golpe contrarrevolucionário a 28 de setembro possibilita uma viragem à esquerda na situação política, com o povo a organizar-se e a avançar, em coletivo, na resolução dos seus problemas.

Nos primeiros dias de outubro de 1974, cerca de quarenta habitantes das Neves mobilizam-se e, por sua iniciativa, durante um sábado à tarde e todo um domingo trabalham na reparação da estrada que liga esta povoação a Beja. No dia seis do mesmo mês são os jovens do bairro do Pelame que iniciam um peditório destinado à angariação de fundos para a construção de um infantário o qual rende, só nesse dia, mais de dez mil escudos.

É a capacidade criativa do povo a vir ao de cima, dando os primeiros passos no caminho da construção do seu destino, de que a forma como decorre o chamado dia do trabalhador (06/10/1974) na cidade de Beja é um bom exemplo. Só neste dia, os carpinteiros da base aérea da cidade substituem todos os vidros partidos das escolas da capital do Baixo Alentejo, que não eram poucos segundo a Câmara Municipal.

Em Albernoa, por influência do MES (Movimento de Esquerda Socialista), o povo e os trabalhadores também se mobilizam para o desenvolvimento de ações destinadas a melhorar as suas vidas.

Em 1957, dois grandes proprietários de Albernoa compram propriedades agrícolas que são atravessadas por dois caminhos rurais de que o povo se servia para aceder a diversos montes. Em 1965, estes proprietários resolvem suprimir estes troços intentando uma ação judicial contra a freguesia de Albernoa, da qual resulta a vitória das suas pretensões, com o tribunal a dar-lhes razão, aduzindo para o efeito uma lei do tempo do Marquês de Pombal, de 1773.

Ora, na manhã de cinco de outubro, data de aniversário da proclamação da República, o povo desta freguesia, armado de tratores, pás, picaretas e enxadas, reconstrói os antigos caminhos, fazendo regressar ao usufruto público o que tinha sido apropriado pelo privado.

Ainda nesta freguesia e neste mês de outubro, a população consegue recuperar para seu usufruto os logradouros em torno da vila – terrenos baldios – de que os proprietários agrícolas se tinham apropriado semeando até às paredes das casas da povoação. O povo reunido em plenário constitui uma comissão que entra em contacto com estes proprietários, os quais, perante a pressão popular, aceitam respeitar os logradouros da povoação.   

Estes dois exemplos de Albernoa são bem ilustrativos da forma como o processo revolucionário se vai instalando no país e, naturalmente, também no concelho de Beja. Perante a desarticulação das forças repressivas do Estado – a GNR e PSP estão confinadas a posto e quartéis e as forças armadas têm quebrada a cadeia de comando – o povo vai paulatinamente tomando conta da rua onde, através de várias ações, consegue os seus intentos: ter uma vida melhor. E ao consegui-lo ganha força e capacidade de mobilização para avançar, para ir mais longe.

É o processo revolucionário a dar os primeiros passos, com o povo a tomar em mãos o seu destino.

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