A LUTA DOS(DAS) ALUNOS(AS) DO LICEU DE BEJA, 1974-1975

O 25 de abril de 1974, ao tirar a tampa à penela de pressão em que se tinha transformado a sociedade portuguesa nos últimos anos da ditadura, conduziu a uma explosão de lutas em todo o país pela liberdade e por uma vida melhor. Beja não foi exceção, fazendo parte integrante do movimento popular que na rua conquistou todos os direitos mais tarde consagrados na Constituição de 1976. No Portugal de abril os direitos e as liberdades não foram uma outorga de um qualquer poder, como aconteceu no caso espanhol, foram uma conquista do povo em luta na rua. Esta é a marca genética da nossa democracia. Uma democracia filha de uma revolução.

            De entre o movimento de massas que ocorre em Beja encontra-se a luta dos(as) alunos(as) do Liceu de Beja, hoje Escola Secundária Diogo Gouveia, por um ensino democrático, a qual se inicia logo em novembro de 1974. Na contestação à Comissão de Gestão do Liceu, formada por professores comprometidos com o regime deposto, que conduziu à RGA (Reunião Geral de Alunos) de 22 de fevereiro de 1975 onde foi convocada a greve exigindo o saneamento dos docentes ligados ao fascismo, a adoção de novas matérias, de novos processos pedagógicos e de avaliação. bem como a suspensão do Despacho que fixava em 12 e 14 valores a dispensa aos exames, respetivamente dos 5.º ano (atual 9.º ano) e 7.º ano (atual 12.º ano), emergiu uma forte corrente de esquerda radical entre os(as) estudantes (UDP, MES. PRP, Grupo informal anarquista) que passa a dirigir a luta.   

            A greve liderada por esta corrente da esquerda radical, não homogénea entre si, confrontou-se com a oposição do Governador Civil, major Brissos de Carvalho, MFA, PPD, PS, MDP/CDE e PCP, com este último partido a mobilizar a classe operária de Beja, especialmente os metalúrgicos, com o objetivo de isolar a greve, apelidando-a de reacionária, ou seja, de fazer o jogo da reação ao 25 de abril. É o PCP a travar a radicalização do processo revolucionário no verão, outono e inverno de 1974/1975, o qual, segundo o partido, a acontecer afastaria as classes intermédias da revolução e, sobretudo, dificultaria a aproximação controladora do partido ao MFA num contexto onde a posição dos militares ainda não estava clarificada, o que só veio a acontecer após a derrota da tentativa de golpe militar de direita a 11 de março de 1975 com o triunfo da via socialista da revolução.

            Cercado o Liceu pelas tropas do MFA, com o apoio dos partidos políticos e da classe operária de Beja, com exceção da construção civil, a greve foi suspensa, mas a esquerda radical que a dirigiu não saiu derrotada. Cinco alunos dirigentes da greve passaram a ter assento na Comissão de Gestão do Liceu, em paridade com os representantes dos professores, a qual integrava, ainda, um representante do MFA, o alferes miliciano Gil Moreira, arquiteto de profissão, e a Pró-Associação que, entretanto, se ergueu, tendo como sede a antiga residência do Reitor, foi totalmente hegemonizada pelos restantes membros do Comité de Greve. 

            Foram estes alunos e alunas que dirigiram ou participaram ativamente nesta greve que, nas localidades do distrito onde eram residentes, desenvolveram projetos culturais de impacto real na comunidade, casos da "Comuna Cultural de Aljustrel", do "Movimento Cultural da Juventude Louredense", da Boavista, ou do "Centro Revolucionário de Cultura e Recreio", de Serpa. Criaram grupos de teatro, constituíram bibliotecas populares, realizaram cursos de alfabetização com um objetivo central, conforme refere o n.º 2 do boletim "Companheiro" da "Comuna Cultural de Aljustrel": "lutar pela cultura popular como fator indispensável para uma verdadeira conquista do poder pelas massas trabalhadoras". Era a revolução no terreno tendo como único limite o céu.

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