A LUTA DOS ALUNOS DO LICEU NACIONAL DE BEJA, HOJE ESCOLA SECUNDÁRIA DIOGO GOUVEIA (IV)

A publicação do decreto sobre gestão das escolas e as médias de dispensa dos exames do 5.º e 7.º anos, medidas contestadas pelos estudantes, foram, de facto, a mola propulsora da RGA, no Liceu, de 22/02/1975. No entanto, o descontentamento é mais profundo e prende-se, como já foi referido no texto anterior, com o não avanço do saneamento dos professores comprometidos com o fascismo e a não aplicação de alterações em termos de currículo das disciplinas e de metodologias de ensino que apontassem para uma escola ao serviço das classes trabalhadoras, a grande reivindicação dos alunos constante em todos os discursos da altura.

As reivindicações, em concreto, que levam à aprovação da greve, com a ocupação das instalações, com início a 24/02/1975, segunda-feira, são revogação do decreto sobre gestão das escolas; alteração do despacho do Ministério da Educação sobre dispensa de exames, propondo-se a dispensa no 5.º ano com média de 10 valores e no 7.º ano com média de 12, em vez, respetivamente, dos 12 e 14 valores contidos no despacho do Governo; saneamento dos professores comprometidos com o fascismo e criação de novas estruturas de ensino no que se refere aos processos de avaliação de conhecimentos, às matérias a lecionar e aos métodos pedagógicos.

A greve, que é aprovada com a oposição declarada e empenhada da UEC (União dos Estudantes Comunistas), órgão estudantil do PCP, liderado pela Zita Seabra, mais tarde dissidente do partido, deixa esta formação partidáriaaltamente incomodada, uma vez que ela não serve a sua ação política do momento, desde logo porque não controlaa greve, não podendo, assim, determinar os ritmos da sua intensidade, a sua flexibilidade e a sua duração, o que impossibilita a sua utilização enquanto instrumento ao serviço de uma estratégia política mais geral. Por outro lado, no contexto da altura, a greve não serve os objetivos do PCP, os quais passam por não assustar a pequena e média burguesia com lutas radicais, suscetíveis de afastarem as classes intermédias do processo revolucionário, lançando-as nos braços da contrarrevolução. Um país funcionando num quadro de conflitualidade controlada pelo PCP, facilita, aos olhos do partido, a sua aproximação ordeira ao poder, o mesmo é dizer ao MFA onde a grande clarificação política estavapor fazer, o que, no entanto, vem a acontecer poucos dias depois, a 11 de março, com a derrota das forças spinolistas e da hierarquia militar reacionária.

Assim, decretada a greve, logo nesse dia – sábado, 22/02/1974, à noite – , por iniciativa formal do Governador Civil, major Brissos de Carvalho, reúnem no Governo Civil os representantes do MFA, PS, PPD, PCP, MDP / CDE, MES, dos sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas, da Construção Civil, dos Caixeiros e Empregados de Escritório e dos pais e encarregados de educação dos alunos do Liceu. Nesta reunião, que se prolonga pela madrugada de domingo, com a oposição do MES, é declarada a greve ilegal e considerado que “os alunos se tinham afastado do novo rumo do país”, forma eufemística de dizer que estavam com a reação, e decide-se, pela via da força, acabar com a greve, impondo-se o início das aulas para 25 de fevereiro, terça-feira.

No seguimento desta decisão, quando segunda-feira, de manhã, os alunos chegam ao Liceu para iniciarem a greve, com ocupação das instalações, encontram o edifício cercado por forças militares e policiais que impedem a sua entrada, confrontando-se com a distribuição docomunicado saído da reunião do Governo Civil, de 22 de fevereiro, onde, para além do enunciado das razões, já referidas, que tinham levado àquela medida autoritária de por fim à greve, sublinha-se o propósito de serem saneados do Liceu todos os estudantes que “não aceitassem as normas democráticas”, o mesmo é dizer os membros do comité de greve que, entretanto, se tinha constituído.

Com o objetivo de isolarem os estudantes da população de Beja e, em especial, do movimento operário, os representantes das forças políticas e sindicais presentes na reunião do Governo Civil, de 22 de fevereiro, convocam, para as 19.00h, de dia 25, na Praça da República, uma manifestação de apoio à medida tomada de por fim à greve no Liceu, onde  as cerca de 3 000 pessoas presentes, na maioria operários, se envolvem em confrontos físicos com os estudantes que chegam ao local em manifestação,muitos deles seus vizinhos e familiares: filhos, sobrinhos, primos, etc.

(Continua)

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