A LUTA DOS ALUNOS DO LICEU NACIONAL DE BEJA, HOJE ESCOLA SECUNDÁRIA DIOGO GOUVEIA (III)

Do 25 de abril de 1974 até ao início do ano de 1975 há um processo acelerado de politização dos alunos do Liceu de Beja, nomeadamente daqueles em cujas famílias a oposição à ditadura esteve sempre presente. Leituras até então proibidas são agora avidamente realizadas, conferindo a estes estudantes uma nova visão do mundo a qual os leva a aderir ao socialismo enquanto projeto de sociedade futura.

Os manuais escolares são definitivamente postos de parte. Em contrapartida lê-se Marx, Engels, Trotski, Álvaro Cunhal, Rosa do Luxemburgo, Lenine, António Gramsci, Marta Harnecker e Gabriela Uribe, Pedro Kropotkin, Mikhail Bakunine, León Tolstoi, Louis Althusser, etc. Discute-se em grupo o livro de William Reich, “O combate sexual da juventude”. Devora-se o que surge publicado sobre o “maio de 68”, em França. Lê-se Simone de Beauvoir e Sarte. Discute-se a problemática do existencialismo, versus marxismo, bem como do estalinismo, versus trotskismo. Obras como “A Luta de Classes em França, “O18 Brumário de Luís Bonaparte”, de Marx; “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado”, de Engels; “As Lutas de Classes em Portugal nos Fins da Idade Média”, de Álvaro Cunhal; o “Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens” e “Do Contrato Social”, de Jean Jacques Rousseau, fazem a sua entrada nas aulas de história. Livros como “A Crítica à Economia Política”, “Teses sobre Feuerbach”, de Marx, e o “Materialismo e Empiriocriticismo”, de Lenine, irrompem pelas aulas de filosofia. Tudo isto protagonizado pelos alunos e tudo isto uma enorme novidade para a maioria do corpo docente do Liceu.

Todas estas leituras só são possíveis graças aos livreiros de Beja, Sr. º Quirino, da “Estudantina”, e Francisco Carvoeiras da “Samid”, que veio a ter a maior livraria de Beja, mesmo junto à “Leitaria Bejense”.

A par destas leituras, naturalmente incompletas e superficiais, o que é determinado pela idade dos leitores, a politização dos estudantes faz-se, ainda, através da imprensa partidária das formações políticas situadas à esquerda, que circula livremente no Liceu: “Esquerda Socialista”, órgão do MES (Movimento da Esquerda Socialista); “Avante”, órgão do PCP (Partido Comunista Português); “”Voz do Povo”, órgão da UDP (União Democrática Popular”; “A Batalha”, jornal anarquista; “Revolução”, órgão do PRP – BR (Partido Revolucionário do Proletariado – Brigadas Revolucionárias); “A Verdade”, jornal do PCP -  ml (Partido Comunista de Portugal – marxista leninista), fação Mendes;  “Unidade Popular”, jornal do PCP -  ml (Partido Comunista de Portugal -  marxista leninista), fação Vilar.


Concomitantemente com a politização dos alunos do Liceu e a sua radicalização à esquerda do PCP, o processo revolucionário português segue o seu caminho também num processo de radicalização, aspeto bem visível nos campos do distrito de Beja, com o Governo a intervir no Monte do Outeiro, de Gomes Palma, freguesia de Santa Vitória, concelho de Beja, e os assalariados rurais, em enorme manifestação  na cidade de Beja, a 2 de fevereiro de 1975, a exigirem a expropriação dos latifúndios e a realização da reforma agrária.

Neste quadro, perante a inexistência de quaisquer medidas que alterem significativamente a estrutura do ensino, que é a que vem do Estado Novo, e perante o não avanço do saneamento dos professores reclamado pelos alunos, o que gera descontentamento, a publicação do Decreto sobre a gestão das escolas e o referente às médias de dispensa aos exames do 5.º ano (atual 9.º ano) – 12 valores – e 7.º ano (atual 12.º ano) – 14 valores, é a mola que impulsiona os alunos do Liceu a decretarem greve por tempo indeterminado, com a ocupação das instalações, em RGA realizada a 22 de fevereiro, sábado, o que deixa o Governador Civil e os partidos representados no III Governo Provisório, especialmente o PCP, “à beira de um ataque de nervos”, o que se traduz na decisão de pôr fim à greve dos estudantes pela força, com recurso, portanto, às forças policiais e ao exército que, dia 24 de fevereiro, cercam o Liceu. 

(Continua)

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