Percorrendo ao longo da temporada musical diferentes concelhos alentejanos, o Festival Terras sem Sombra (TSS) tem na sua matriz uma perene marca internacional. Uma feição além-fronteiras patente, entre outras dimensões, na presença nos palcos alentejanos de ensembles e intérpretes de variegados países e continentes, contribuindo para internacionalizar uma região que ama a música, mas esteve condenada, durante muitos anos, a não ter uma programação regular de música clássica. No ano em que celebra a sua 19.ª temporada, subordinada ao tema “O que fica do que passa: Um breviário de resistência musical”, o TSS tem como país convidado a Áustria. Daqui decorre um destacado leque de concertos em vários pontos dos quatro distritos do Alentejo com a presença de intérpretes de grande envergadura, como Johannes Fleischmann (violinista), Sabina Hasanova (pianista), Jörg Ulrich Krah (violoncelo) e Bernhard Parz (piano). Uma relação entre os dois países europeus, nos palcos do Festival, que se firma desde a temporada passada do TSS, quando o Trio Klavis se apresentou, com grande êxito, em Ferreira do Alentejo.

A consubstanciar esta partilha de traços culturais, históricos e sociais entre Portugal e a Áustria potenciada pelo TSS, o Festival esta presença em Viena, momento para aprofundar laços com instituições deste país e uma comitiva portuguesa constituída por autarcas alentejanos, entidades ligadas à cultura e órgãos de comunicação social, entre outras áreas da sociedade civil. Da agenda do Festival na capital austríaca, há a destacar a oportunidade para, no coração da Europa Central, evidenciar o carácter singular do TSS, dada a sua tríplice dimensão, nas áreas da Música, Património e Biodiversidade, estabelecer pontes e aprofundar parcerias. Momento assinalável da jornada alentejana na capital austríaca é o do recital com duas figuras destacadas da grande música nacional, a soprano Carla Caramujo e o pianista Pedro Costa. Um programa na cidade musical por excelência – onde brilharam nomes maiores como Mozart, Haydn, Beethoven, Schubert, Brahms ou Gustav Mahler – que conta com o apoio da Embaixada de Portugal em Viena.

Na urbe tocada pelo Danúbio e pela arquitectura sublime, patenteada na catedral de Santo Estêvão e no palácio de Schönbrunn, o TSS apresenta num edifício muito emblemático da vida cultural e social austríaca, a Haus der Musik, o recital “Ao Encontro da Alegria: A Música Portuguesa no Contexto da Música Europeia (Séculos XIX-XXI)”. Trata-se da oportunidade para revisitar obras, por exemplo, de Franz Schreker, Lili Boulanger, António Fragoso, Francisco de Lacerda, Fernando Obradors, Richard Strauss e Fernando C. Lapa.

Carla Caramujo, uma das mais aclamadas sopranos portuguesas da actualidade, venceu os Concursos Nacional Luísa Todi, Musikförderpreis der Hans-Sachs-Loge (Alemanha), Dewar Awards, Chevron Excellence e Ye Cronies Awards (Reino Unido). É diplomada pelas Guildhall School of Music and Drama (Londres) e Royal Conservatoire of Scotland (Glasgow). O interesse pelo repertório contemporâneo levou-a a criar o papel de Salomé, na estreia de O Sonho, de Pedro Amaral. Interpretou La Princesse na estreia de Orphée, de Philip Glass, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, Flight Controller em Flight, de Jonathon Dove em Glasgow, Soprano em Lady Sarashina, de Peter Eötvös, e a estreia mundial de Vida e Milagres de D. Isabel, de Alexandre Delgado.  Gravou Requiem Inês de Castro, de Pedro Camacho, finalista das nomeações aos Grammy 2019, Integral das Canções de António Fragoso, com João Paulo Santos (Framart, 2018), Il Mondo della Luna, de Pedro AntónioAvondano, com Os Músicos do Tejo (Naxos, 2020) e Domitila, de Ripper, com Toy Ensemble (MPMP, 2020).

Especializado no acompanhamento de canto e música de câmara, Pedro Costa é um pianista português radicado em Viena e, desde 2017, ensina na Universidade de Música e Artes Performativas de Graz. Foi o vencedor de importantes certames, como o Concurso de Interpretação do Estoril, o Prémio Helena Sá e Costa, o Concurso Louis Spohr (Alemanha) ou o Concurso New Tenuto (Bélgica). Tem actuado, na qualidade de solista, com a Orquestra Sinfónica Portuguesa, a Orquestra Metropolitana de Lisboa, a Orkest der Lage Landen e a Koninklijke Muziekkapel van de Gidsen. Já se apresentou em salas como Wigmore Hall (Londres), MusikVerein (Viena), Große Saal Mozarteum (Salzburgo), Casa da Música, CCB, Teatro S. Carlos e Fundação Gulbenkian. Juntamente com o oboísta Guilherme Sousa e o fagotista Paulo Ferreira, fundou o Perspective. Mantém intensa actividade com o Trio à la Joie, ao lado da soprano Marina Pacheco e do barítono Tiago Matos.

Dois mil e vinte e três revela-se um ano paradoxal para o Terras sem Sombra, já que, ao mesmo tempo que triunfa fora de portas e granjeia parceiros internacionais, foi preterido nos últimos concursos da Direção-Geral das Artes, à semelhança de muitas iniciativas artísticas situadas fora de Lisboa ou do Porto. “O Alentejo está em risco de perder a sua única temporada de música erudita; ainda há, em Portugal, quem entenda que um residente no interior não deve ter as mesmas oportunidades de acesso à cultura do que quem vive nas grandes áreas metropolitanas”, refere Sara Fonseca, directora executiva do Festival. E acrescenta: “o equilíbrio que se tinha conseguido nos últimos anos vê-se agora posto em causa, mas não vamos cruzar os braços, temos que procurar fora do país a viabilidade que se nega, entre nós, a um festival alentejano com vinte anos de currículo”. A Áustria é um parceiro sólido nesta caminhada.

Após a apresentação em Viena, o TSS retoma a sua programação no território alentejano com um novo fim-de-semana de actividades, a 14 e 15 de Outubro no concelho de Odemira, seguido de Vidigueira (28 e 29 de Outubro), Arraiolos (11 e 12 de Novembro), Montemor-o-Novo (2 e 3 de Dezembro), Sines (16 de Dezembro) e Évora (data a confirmar).

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