
Um Revolucionário Bacteriologicamente Puro
Francisco Pimenta, era o nome deste radical da revolução, que, para se manter um revolucionário bacteriologicamente puro, conseguiu, em trinta anos de vida, ter a mesma ação cívica do Luisinho Fortunato, filho do antigo latifundiário do Monte da Chaminé, agora “cabo” do Chega na localidade.
Ele dizia-se revolucionário. Na repartição pública onde trabalhava há cerca de trinta anos e no café mais movimentado da vila todos o conheciam pelas críticas impiedosas que fazia aos diferentes governos. Governos do PSD, do PSD + CDS e do PS eram, segundo ele, “Governos da burguesia, Governos de direita, defensores do neoliberalismo, apostados em retirar direitos aos trabalhadores e em destruir o estado social onde pontificavam o Serviço Nacional de Saúde, a Segurança Social e a Escola Pública”. Era igualmente crítico em relação ao “Governo da Geringonça”, “uns sociais democratas entretidos a enganar o povo”. Os partidos de direita, em consonância com o que pensava dos seus governos, também não eram poupados nas suas críticas. “Uma cambada de corruptos visando encher os bolsos à custa do povo”, eis o que eram todos na sua boca. Quanto aos partidos da esquerda, via-os, e publicamente explicitava esta sua visão, como “uns medrosos, fazendo o jogo do capital e traindo todos os dias o povo.
O poder local, que no seu concelho, tinha sido gerido pela CDU e agora pelo PS, também não era poupado. “Gente incompetente, governando para si e para os amigos”, era, para ele, o que representavam os eleitos locais.
Com este discurso quando havia um “abaixo assinado” em defesa da Escola Pública, do Serviço Nacional de Saúde ou relacionado com qualquer outra reivindicação do povo, ele era, em regra, o primeiro a ser contactado. As suas posições públicas faziam dele um natural subscritor deste tipo de petições. No entanto, nunca assinou qualquer “abaixo assinado”. A sua justificação era que isso “eram formas de luta de crianças que nem cócegas faziam na barriga dos exploradores do povo”.
Também era frequentemente convidado para participar em manifestações de rua em defesa de direitos políticos ou de luta por reivindicações que melhorassem a vida das pessoas. Nunca participou em qualquer destas ações, pois, segundo ele, tudo isso “era folclore que só servia de riso à burguesia exploradora”. Por diversas vezes foi convidado para exercer o cargo de delegado sindical, contudo nunca aceitou tal, pois, para ele, “os sindicatos eram dirigidos por “amarelos” que, em vez de defenderem os interesses dos trabalhadores, faziam o jogo do patrão”.

Na sua vida profissional foi confrontado com diversas greves gerais, umas desencadeadas unicamente pela GTTP, outras com a convergência da UGT. Nunca fez qualquer greve, chegando mesmo a ser o único a trabalhar na sua repartição nestes dias de luta. A justificação era de que “as greves de um só dia serviam unicamente para desmobilizar os trabalhadores da luta e que ele não pactuava com ações dessas de traição ao movimento revolucionário dos trabalhadores”. Quanto às greves da função pública, setor onde trabalhava, também não fez nenhuma ao longo da sua carreira profissional, uma vez que, conforme dizia, “não entrava em esquemas de greves à sexta-feira, greves oportunistas que só serviam para prolongar o fim-de-semana. Fossem elas a meio da semana e ele faria todas”.
Na vila onde vivia, ao longo dos seus trinta anos de adulto, formaram-se, pelo menos, quatro comissões de cidadãos para exigir junto da câmara municipal medidas que melhorassem as condições de vida dos munícipes. Convidado para nelas participar, nunca integrou nenhuma. A resposta ao convite era sempre a mesma: “não dou para esse peditório, não sirvo para dar palco a meia dúzia de indivíduos medíocres da nossa terra que só querem das nas vistas”.
Francisco Pimenta, era o nome deste radical da revolução, que, para se manter um revolucionário bacteriologicamente puro, conseguiu, em trinta anos de vida, ter a mesma ação cívica do Luisinho Fortunato, filho do antigo latifundiário do Monte da Chaminé, também funcionário público, que ao longo dos mesmos trinta anos, na mesma vila, clamou contra greves e manifestações cívicas de defesa da democracia, o que intercalava com discursos inflamados contra os comunistas que, segundo ele, “tinham vilipendiado a pátria” e que agora era o “cabo” do Chega” na localidade.