FRIO EM CASA

Portugal tem um endémico problema que poderíamos chamar de desconforto doméstico, provocado, em grande medida, pela deficiência construtiva das habitações a nível térmico.

Segundo o Portal da Construção Sustentável, e com base num estudo de 2022, 88% dos portugueses “não se sentem confortáveis dentro de casa devido ao frio ou ao calor”.

Esse não é apenas um problema do mundo rural. De acordo com o Centro de Investigação em Ambiente e Sustentabilidade, (Faculdade Nova de Lisboa), o fenómeno das migrações para as zonas urbanas nas décadas de 70 e 80 do séc. XX, “fez com que se construísse mal, rápido e barato”, onde 80% dos edifícios “apresenta má qualidade de construção” a nível térmico.

Não disponho de dados rigorosos sobre o impacto dessa realidade na saúde das pessoas ou até na mortalidade. Parece-me, no entanto, que as consequências serão óbvias, sobretudo quando se sabe que os ocupantes de muitas dessas casas são pessoas idosas, com frequência com quadros de saúde de enorme debilidade. E sobretudo idosos pobres. Mas não só.

De facto, a taxa de pobreza nos maiores de 65 e mais anos, em 2020 situava-se nos 20,1%, enquanto para o grupo de crianças/jovens até aos 18 anos era 20,4%. Preocupante só por si, mas nada de novo, para além de que no presente a situação se agravou, pois segundo a EAPN, em outubro de 2022 esse indicador era de 22,4%.

Acontece, no entanto, que são os idosos, no campo ou na cidade, que em regra vivem nas habitações mais degradadas. Em muitos casos, as deficiências construtivas, aliadas à degradação avançada dessas moradias, determinam situações de penúria ambiental, quase sempre agravadas pelo facto dessas pessoas auferirem pensões que não lhes permite fazer as obras necessárias, ou usufruir de sistemas de aquecimento, no caso do frio, a gás ou a eletricidade.

Não têm existido políticas públicas centradas nesta problemática social. Os programas nacionais e municipais de melhorias nas habitações de idosos, para além de residuais face à dimensão do problema, têm-se centrado sobretudo na questão das instalações sanitárias, no derrube de barreiras arquitetónicas ou ainda na melhoria das coberturas. O que é importante, mas não resolve este problema.

Do que conheço, as Estratégias Locais de Habitação que à escala municipal começam agora a ser implementadas, não tiveram em conta esta realidade. Assim como muitas outras, como seja o acesso à habitação por parte dos jovens.

Frio em casa. Esta é apenas uma das muitas situações que a pobreza faz acentuar. Uma realidade fria, como o frio que essas pessoas sentem.

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